Partilhe nas redes

Uma dor social

A solidão tornou-se num problema sério de saúde pública, que pode transbordar para outras áreas da sociedade, como a da segurança (comportamentos de risco) e da economia (produtividade) e da participação cívica (desconfiança nas pessoas e instituições).

Quando, em janeiro de 2018, o Reino Unido criou o Ministério da Solidão, causou surpresa em todo o mundo – e com ela algumas piadas. “Isto é tão britânico. Eles identificaram o problema humano mais inefável e arranjaram a mais fria e burocrática solução”, comentou o humorista Stephen Colbert. Mas passada a estranheza, emergiu a pertinência da medida. Outros governos contactaram o seu congénere britânico para aprender e unir esforços porque, afinal, trata-se de uma realidade global e de grande incidência.

A probabilidade de morrer precocemente é de 5% para quem está exposto a elevada poluição atmosférica; de 20% para os obesos; de 30% para quem bebe álcool em excesso e de 45% para quem sofre de solidão. Trata-se, portanto, de um problema grave de saúde pública, que começa a preocupar governos de todo o mundo.

Se desenharmos a incidência da solidão face à faixa etária, constatamos que faz uma curva em “U”, com as extremidades a representar faixas da população mais velha e também faixas da mais jovem. Aliás, se 46% dos norte-americanos diz sentir-se só, é na chamada Geração Z – dos 18 aos 22 anos de idade – que esse sentimento se manifesta mais forte (segundo um estudo de 2018).

Ao contrário do que sugere a piada de Colbert, a solidão tem consequências muito concretas e demonstradas, algumas das quais acarretam custos que nenhum governo pode ignorar. Está cientificamente demonstrado que a solidão gera no cérebro humano um modo de autopreservação, que por seu turno potência interações sociais negativas. Quando se vê nos outros potenciais inimigos, perde-se empatia, confiança e os comportamentos anti-sociais – incluindo os criminosos – tendem a surgir.

Aquele modo de sobrevivência também espoleta mecanismos neuro-biológicos que degradam a saúde física e mental:  indivíduos sós revelam-se mais propensos a depressão; têm fraca qualidade de sono durante a noite e mostram níveis elevados de cortisol de manhã (uma hormona indutora de stress); desenvolvem mais comportamentos impulsivos que os colocam em situações de risco e resistem pior a inflamações.

O que se pode fazer? Para uma pessoa afetada pela solidão, uma vez reconhecido o problema e aquilo que faz à sua mente e corpo, o neurocientista John Cacioppo – que estudou a solidão durante décadas – prescreve uma solução simples: essa pessoa deve criar ligações em três áreas ou níveis da sua vida. No nível íntimo, conseguindo confiar em algumas (muito poucas) pessoas. No nível relacional, partilhando momentos agradáveis com familiares e amigos. No nível comunitário, envolvendo-se com realidades maiores do que a sua esfera pessoal, por exemplo juntando-se a uma causa ou fazendo voluntariado. “Da próxima vez que se sentirem alienados, isolados ou excluídos, respondam a esse sinal aversivo e façam como fariam se tivessem fome ou sede. Liguem-se”.

 

(Vítor Simões)

saiba mais

Skip to content